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Acerca do Plano Divino

Provas absolutas

 

Representação artística de um pequeno

fragmento da molécula de ADN.

O Deus necessário e a fé suficiente

Deus como o Pai.

A causa primeira

Coincidências...

Deus como Espírito

O livre arbítrio

Livre arbítrio e Ciência

Livre arbítrio e o problema do Mal

Deus como o Filho.

O milagre da vida

A impossível abiogénese

ADN e ARN

O que vai dizendo a ciência

 

 

O Deus necessário e a fé suficiente

A certeza da existência de Deus, de um mundo espiritual ordenado, hierarquizado, regido por princípios inabaláveis – liberdade e amor – princípios que, nesse mundo, são naturais, confere à existência material o sentido que parecia faltar-lhe.

Poderá parecer que hierarquia contende com liberdade. De facto, a hierarquia espiritual apenas delimita os efeitos do exercício da liberdade, impedindo que tais efeitos influenciem, indevidamente, o que é próprio de outras entidades no mesmo nível da hierarquia espiritual. A hierarquia é um imperativo da ordem. Onde a ordem é respeitada a hierarquia não se manifesta como antídoto do caos.

A certeza da existência de Deus, nas suas três pessoas ou entidades, é ponto de partida indispensável para a sua maravilhosa descoberta até onde pode ir o entendimento humano.

Na hierarquia espiritual, as almas ocupam o escalão mais baixo. Porém, tanto como os anjos, fazem parte do Espírito Santo, são parte de Deus. Ao serviço da alma, identificados com esta, somos investidos de uma dignidade que anula todas as servidões humanas. Eis o que Paulo escreve, dirigindo-se a cada escravo:

És chamado escravo? Não te preocupes com isso. Porém, se puderes ganhar a tua liberdade, aproveita. Mas segue um princípio mais amplo: Quem é chamado escravo é livre no Senhor, assim como quem era livre, quando chamado, se torna escravo em Cristo. (Coríntios 7:21–7:22)

A certeza da existência de Deus é temida pelos abusadores, públicos e privados, pois que liberta a pessoa e emancipa o súbdito. Indivíduos livres, como pessoas, pela sua alma, e como cidadãos pela sua presença em sociedade, não disfarçam a mentira, não toleram o crime, não apaziguam a justiça. Os livres obedecem a Deus, a quem pertencem, e desdenham o usurpador terreno.

Ainda que a pessoa seja livre pelo exercício da alma, as circunstâncias limitam e contrariam o exercício da vontade. Mas a Providência Divina é solícita, nunca deixa de corresponder ao que pede o aflito. Mas o aflito tem de pedir, suplicar convictamente, não porque Deus se faça caro mas porque a liberdade de quem pede o impõe. E, ainda assim, a Providência Divina, que também é Misericórdia, tantas vezes se antecipa ao imprudente para lhe evitar o acidente funesto. Disse Jesus:

Assim, se vós, sendo maus, sabeis dar bons presentes aos vossos filhos, quanto mais vosso Pai que está nos céus dará o que é bom aos que lhe pedirem! (Mateus 7:11)

Crede-me quando digo que estou no Pai e que o Pai está em mim; crede-o, ao menos por causa das minhas obras. Vos asseguro que aquele que crê em mim também fará as obras que Eu faço e outras maiores fará… (João 14)

Para usufruir do extraordinário concurso da Providência Divina é preciso ter fé. A fé suficiente que, tantas vezes e em tantos, falece no coração. Ora, se Deus não se vê e facilmente se esquece, a sua evidência salta aos olhos.

As três mais clamorosas evidências da existência de Deus nas suas três pessoas ou entidades -- Pai, Espírito (Santo) de Deus e Filho -- surgem, ordenadamente, ao longo da cronologia humana.

A evidência da primeira causa é intuitiva. Assim, a crença na existência de um Pai Criador, do iniciador de tudo, é geral e antiga. A causa primeira não poderia ser material pois que o mundo material exige sempre uma causa antes de qualquer causa (o seu efeito), até ao infinito.

O significado do livre arbítrio -- a segunda evidência absoluta de Deus -- como manifestação espiritual tornou-se claro pela confirmação de que o mundo material opera segundo leis fixas que dele excluem toda a arbitrariedade. Nos séculos XVII e XVIII, ainda os cientistas eram, como lhes cumpria, filósofos. E, como o livre arbítrio evidencia o Espírito, eram crentes.

Depois, sobre a ciência árdua e honesta -- a qual nunca cessou de prosperar para proveito da segurança e conforto humano -- foi-se incrustando uma camada, cada vez mais espessa e tenaz, de duvidosos cientistas, funcionalizados ao serviço do ateísmo, formatados para escamotear novas e eminentes evidências da Divindade.

Em meados do século XX, a descoberta do ADN e do ARN -- a terceira evidência absoluta de Deus -- mostrou que a vida é um colossal agregado de informação e, portanto, de inteligência. Um simples cálculo estatístico demonstra que a vida nunca poderia ter surgido da organização casual da matéria inorgânica. Há, pois, uma entidade que, prodigiosamente inteligente, potente e autónoma, modela e tutela o mundo material desde a sua criação. É o Filho.

Perante tão clamorosas evidências, a fé, indispensável elemento da vivência espiritual, deixa de ser indispensável à crença. É de perguntar: – não se haverão tornado, as igrejas instituídas, instrumento de ocultação do Divino à medida que foram perdendo o estatuto de oportunos, privilegiados e exclusivos arautos da Revelação?

Como não estranhar que a presença do Divino na Terra, manifestada abundantemente pelo Milagre (do qual a vida biológica é o mais grandioso) e por frequentíssimas aparições da Rainha do Céu, seja escamoteada em lugar de jubilosamente festejada? Não fora a expontânea e grata devoção dos simples, a glória divina permaneceria oculta à maioria. Disse Jesus, dirigindo-se aos discípulos:

Vós sois o sal da terra. Mas se o sal se tornar insípido, com que se salgará? Vós sois a luz do mundo. Nem a cidade na montanha pode ser escondida nem se acende uma candeia para a colocar debaixo de um alqueire mas sim no candelabro, para que brilhe para todos os da casa.

O mérito da Igreja Católica centra-se, não é pouco, na preservação da memória e do sentido, por enquanto acessível, da maravilhosa epopeia de Jesus Cristo. Mas as suas homilias arrastam-se, demasiadas vezes, na repetição de lugares comuns, meritórios mas raramente inspiradores, motivando o desinteresse e gradual afastamento de crentes e menos crentes. Os evangélicos, ao querer preencher o vazio, desdenharam do coração, esse plano intermédio onde a alma se encontra com a mente e as maravilhas de Maria Santíssima acontecem. Os espíritas oficiosos, esses, assumem uma sapiência que se torna duvidosa pela relativa vulgaridade, ufanos de uma codificação prematura; ao menos, são operativos. Investem directamente o mundo espiritual trazendo algum alívio a saudosos e sofredores.

O humano continua a querer imaginar-se no centro das coisas. Saber que Deus existe incomoda-o, contraria-o. Aceita mal que o mundo material, ele incluído, seja mero acessório, ainda que importante, de um projecto divino que não entende.

Também o incomodará a infinita generosidade do Pai. Que o Criador tenha concedido às criaturas a mesma absoluta liberdade que é a Sua -- porque é a Sua -- envergonha o instinto de abuso que se acorda no forte perante o fraco.

Talvez, a esse humano -- o qual, apesar dos dons intelectuais e morais que o Criador lhe conferiu, persiste em se encostar ao trivial -- lhe conferisse tranquilidade o presumir que, depois da morte, viria a aniquilação, o gratuito e inconsiderado repouso. Porém, a vida continua, no Espírito. Para uns, a verdadeira vida; para outros, a verdadeira morte.

Uma mente equilibrada gostaria que Deus existisse. Mas pode não saber se Ele existe como realidade. Compreende-se que o deseje. A verdade estaria melhor entregue a quem tudo sabe que deixada ao cuidado de gente limitada. E o dom da vida seria enaltecido e não desvalorizado. Deus, é confiável. Tudo sabe, tudo pode, tudo o que Ele quer é bom e o faz. Porque tudo sabe, ele é a Verdade, toda a Verdade. Porque tudo pode, ele é a Vida, toda a Vida. Porque é bom, assiste-nos em permanência.

A leitura do livro de Raymond Moody, Life After Life (Vida Depois da Vida)  bastará para persuadir, pela prosaica via experimental, própria da ciência, que há muito, muitíssimo, mais para lá da matéria e dos sentidos habituais. Moody foi dos primeiros a recolher de, forma sistematizada, experiências de quase morte -- EQMs. Desde que o mencionado livro foi publicado, um corpo imenso de evidências sobre a vida espiritual -- na sua extrema complexidade, diversidade e, ao mesmo tempo, unidade --  foi sendo acumulado. Ver o magnífico canal do YouTube, Afinal o Que Somos Nós:

Achamo-nos incapazes de aceitar a existência de Deus? Filhos da ciência, queremos provas, evidências, não nos basta a fé vivida na intimidade. E, como não conhecemos as evidências já disponíveis, concluimos que Deus não existe. Se Deus existisse haveria de manifestar-se, reclamamos. Mas será que não se manifesta? Não reparar no que está à frente dos olhos demonstra distracção e não ausência do que era procurado. Demonstra que, afinal, nada se procurava. Quantos esperam por Deus mas nunca o procuram.

A presença de Deus manifesta-se pelos escritos que Ele inspira, pelos factos extraordinários e certificados que só Ele pode realizar e, directamente, no íntimo de cada um, quando em sintonia com Ele. Porém, reclama o ateu: -- A vossa alma não é a minha! Escritos são escritos! E, quanto a milagres, não tive conhecimento directo de nenhum. -- Ver para crer. Como terá concedido Jesus a São Tomé. Também terá dito: -- O pior cego é o que não quer ver! -- E recriminou os apóstolos: -- Vistes e, mesmo assim, não acreditastes.

Que haverá para ver? Três evidências. Enormes! Infelizmente, quanto maior a coisa menos reparamos nela, ainda que seja claríssima. É verdade que quem não quer que se veja a coisa e não a podendo ocultar, oferece óculos embaciados a quem a olha.

Como dissemos atrás, a primeira evidência é a da necessidade de um Pai, do Criador. Meramente lógica, abstracta, tal evidência esteve acessível desde sempre. A segunda evidência é a da existência do Espírito (Santo) de Deus como algo distribuído, uma expansão do Pai. De facto, logo que os cientistas de séculos anteriores compreenderam com que inexorável justeza funciona o mundo material, concluíram que havia algo mais. Algo entre a matéria mas que não era material pois que era livre, o livre-arbítrio. A terceira evidência, a do Filho, é mais recente, concreta, explosiva. E, tal como as anteriores, imensa. É a vida biológica, a mais extraordinária e complexa obra de engenharia na Terra!

A Trindade é um mero esquema? Será mais do que um esquema! Mas, como esquema, já é útil. Os esquemas descrevem, para que se compreenda, o que se oculta em si mesmo e de que só conhecemos as manifestações. Alcançar o espírito pela razão requer esquemas.

A fé, a fé gratuita, é supérflua? Não propriamente. A fé é intuição, conhecimento sem palavras, vivenciar o que se aceita, um dom raro. Pode acreditar-se, dar crédito, e não se ter fé. Felizmente que acreditar mediante evidências é acessível a todos e pode acordar a fé no coração de cada um.

Deus como o Pai

A causa primeira

O Big Bang, algo parecido com um grande estouro, uma expansão súbita que ocorreu no início do universo e que explica porque todas as galáxias estão, ainda hoje, a afastar-se umas das outras. Como aconteceu esse prodígio? Acreditamos que foi Deus a causar o tal Big Bang para que o mundo dele decorresse automaticamente de modo a que viesse a surgir um planeta, pelo menos um,  propício à vida, a Terra.

Porém, eu não colocaria uma mera hipótese científica sob a responsabilidade de Deus. Nem todos os cientistas aceitam a hipótese do Big Bang, aparentemente dominante. Para justificar o Big Bang, aduz-se que o espaço vazio é, afinal, palco de oscilações quânticas cuja amplitude é fruto do acaso. Num determinado momento, ocorre uma singularidade, uma oscilação excepcional tão poderosa que dá origem ao tempo, ao espaço, ao universo.

Mesmo que nada percebendo de Física, fica-se a pensar. Se, antes do início, não havia espaço, onde e como ocorre a singularidade? Se, antes do início, não havia tempo, quando ocorre essa singularidade tão altamente improvável? De modo que a hipótese do Big Bang terá de creditar Deus como autor do universo.

O conhecido cosmólogo, Stephen  Hawking , ateu, escreveu em 1973: “A criação do Universo a partir do nada tem sido discutida, indecisamente, desde os primeiros tempos. Os resultados que temos obtidos apoiam a ideia de que o universo começou há um tempo finito. No entanto, o ponto real da criação, a singularidade, está fora das leis da física atualmente conhecidas.” Citado em Meyer, Stephen. Return of the God Hypothesis. Harper One.

Não é problema nosso saber se Deus criou o universo por meio do Big Bang. É tarefa dos físicos, com as suas equações e teorias. Tarefa árdua pois hão-de ajustar os seus cálculos aos dados, cada vez mais numerosos e precisos, que são recolhidos pelos instrumentos de medida que prescrutam o espaço.

Há dias, ouviu-se dizer a um físico, notório mas petulante, que Deus não tem a ver com nada. Julgo que tem a ver com tudo excepto com conjecturas de físicos. A ciência especulativa tem o seu lugar, está na linha da frente do processo de elaboração do conhecimento. Mas especulação é isso mesmo. Infelizmente, cientistas há que, a bem do ego e da carreira profissional, defendem as suas equações como se fossem verdade estabelecida. Garantidamente honesta, só a ciência aplicada.

Com Big Bang ou sem Big Bang, criar é fazer existir o que não existia. O próprio humano é criador, na Arte e na Técnica. Alegoricamente, e com alguma razão, dizemos que o artista e o inventor são criadores. Mas criar mesmo, repita-se, é fazer surgir do nada. Não é muito exacto dizer que a causa cria o efeito. O efeito já está presente na causa que manifesta. Deus é o criador absoluto não porque tenha criado o mundo, o mundo existe nele, mas porque se criou a si mesmo. Ele é a primeira causa, a causa incausada.

O que não parece fazer sentido... Não faz sentido no plano material. No plano material, o que faz sentido é que a cada efeito corresponda uma causa. Ao recuar ao longo de uma cadeia causal haverá de se chegar a uma causa primeira. Para evitar Deus como causa primeira, ter-se-á de recuar infinitamente para trás na linha da causalidade. Que se prefere, o infinito ou Deus? O infinito é deste mundo mas só existe no papel. Deus não é deste mundo mas, pelos vistos, manifesta-se por ele.

Deus, ao criar a primeira coisa, a segunda causa, criou todas as coisas sem ter de as criar, uma por uma. Tendo-se criado a si mesmo, Ele criou o mundo. Por meio do Big Bang? Não sabemos. A nós, que não somos físicos teóricos, pouco interessa. Criou um mundo com as leis físicas certas.

A teoria do Big Bang é uma ratoeira para os crentes. Se é sedutor imaginar que o Pai lançou o universo através de um único, elegante e potente acto -- o Big Bang -- não será prudente que os crentes, como crentes, se imiscuam em controvérsias da ciência. A Igreja cobriu-se de ridículo ao defender o geocentrismo. Não aprendeu a lição? Não só para a Igreja o opróbrio; o sistema heliocêntrico de Aristarco, conceptualmente simples mas não evidente, esperou séculos e séculos por Copérnico, por Galileu.

Coincidências...

Pela sua dificuldade, geologia e astrofísica são ciência na infância. Nem o surgimento e evolução da Terra e do Sistema Solar, nem a dinâmica actual do nosso planeta, estão perto de ser esclarecidos. De onde vem a água e o petróleo, tão abundantes? Porque há nascentes de água doce nos fundos dos mares? Porque voltam a encher-se os poços de petróleo alguns poucos anos após o seu esgotamento? Como é que um continente único, tendo-se fracturado, originou vários continentes os quais continuam a afastar-se uns dos outros? Porque se distribuem assim os planetas, ficando os menores, rochosos, próximos do Sol enquanto os maiores, constituídos, como o Sol, principalmente de hélio e hidrogénio estão bem mais longe?

Se a ciência dominante (ou melhor, dominadora) fecha os olhos a perplexidades tão fascinantes recusando apreciar novas ideias, por muito sérias e consistentes que sejam -- tal como a teoria da expansão da Terra -- muito mais fechará os olhos a coincidências notáveis que mais não serão do que sinais que o Criador quer transmitir, da sua presença, às suas criaturas.

Algumas simples coincidências bastam como sinal grandioso da discricionariedade divina. Não coincidências que possam vir a obter explicação pela Física e pela Matemática mas coincidências puramente factuais. Assim:

-- O diâmetro do Sol é 108 vezes maior que o da Terra e a sua distância à Terra é 108 vezes maior que o seu diâmetro. Esta relação não se verifica para qualquer outro planeta do nosso sistema solar.

-- A relação entre os raios das órbitas de Mercúrio e de Vénus obedece ao seguinte. Se encostarmos três círculos com o mesmo raio, a órbita de Mercúrio passará pelos centros dos círculos enquanto a órbita de Vénus lhes é tangente.

Martineau, J. Coincidences in the Solar System.

Uma coincidência que todos os povos e cada um de nós pode facilmente constatar. As distâncias Terra-Lua e Terra-Sol estão na mesma proporção do diâmetro daqueles astros (400x) pelo que, num eclipse do Sol, a Lua o oculta exactamente:

Os antigos viram em tais “coincidências” um sinal do divino. Os modernos vêm... simples curiosidades.

Deus como Espírito

O livre arbítrio

Se Deus criou o humano, o humano parece continuar a criação à maneira radical de Deus, a partir do nada ou de algo indiferente, determinando o que vai acontecer a seguir, com inteira liberdade, dentro das circunstâncias que lhe cabem. Referimo-nos ao livre arbítrio.

Sendo a criação tanto mais criativa quanto menor a causa aparente e maior o efeito, pode dizer-se que o pensamento é acto de criação pura, seja criação literária, artística ou técnica. Também o pensamento comum é criativo. Não tem de ser brilhante nem famoso. Em parte, o que pensamos e fazemos é obrigatório, tem de adaptar-se às circunstâncias. Se temos fome, havendo alimento, comemos; se temos sono, terminado o labor diário, deitamos-nos. Mas sabemos que não teria de ser assim. Tudo o que fazemos, poderíamos não fazer, não querendo.

Percebemos que os milhares de gestos que realizamos em cada dia poderiam ter sido outros. Dispomos de evidente controlo sobre as nossas acções pois controlamos os nossos pensamentos, simplesmente, pensando. Todos dispomos, constantemente, de livre arbítrio embora nem sempre façamos uso dele.

O livre arbítrio não se manifesta pelas decisões que tomamos mas pelo reconhecimento de que poderíamos ter tomado outra decisão, qualquer outra. Quem nega o livre arbítrio foca-se na origem da decisão tomada, discute a sua liberdade ou necessidade. Isto, é praticar ilusionismo. O livre arbítrio não reside na decisão tomada mas na infinidade de decisões que poderíamos ter tomado, à margem de qualquer motivo.

A ideia de livre arbítrio é composta de duas: liberdade e arbítrio. Afinal, são os atributos indispensáveis e complementares da criação. A liberdade permite-me conceber inúmeras possibilidades dentre as quais escolho uma qualquer sem ter de me submeter a uma razão ou causa vinculativa.

Realmente, não é o homem que cria. O homem pensa. É a sua alma que cria. O homem põe, a alma dispõe. O livre arbítrio é outra prova da existência de Deus. Ou melhor, a prova da presença de uma componente espiritual em cada um do nós, a alma.

Dizem alguns que o livre arbítrio é mero resultado do pensamento ou de outro qualquer processo material pelo qual se organize a informação. Qual a necessidade de introduzir uma alma? Caem numa contradição. Se o processo é organizado, não é livre. O resultado do processo fica determinado assim que nele se introduzem as condições iniciais. É como um problema em Física ou em Matemática. Introduzem-se os dados, obtém-se um único resultado.

Eis uma situação em que o resultado não está determinado à partida. Pensar no voto de uma assembleia. A assembleia, por ser livre, explora todas as possibilidades. Depois, por ser soberana, escolhe. No entanto, não se diz que a assembleia tem alma. Pode-se dizê-lo, mas figuradamente. A verdade é que a decisão da assembleia resulta da composição de muitas decisões individuais, cada uma tomada por uma alma.

Outro exemplo. Uma aplicação, num computador, pode tomar decisões. Um computador que joga xadrez toma, até, para cada movimento, a decisão óptima, vencendo o melhor mestre. Em cada decisão incorporam-se múltiplos arbítrios, mas não há liberdade. A aplicação informática não é livre de tomar outra decisão senão a melhor, dentro de critérios previamente estabelecidos pelo programador humano! Não é a tomada de decisão que caracteriza o livre arbítrio mas a possibilidade real de tomar outra decisão qualquer.

Se o livre arbítrio é uma ilusão, se, apesar de poder manifestar-se em cada momento, em cada um de nós, ainda considerarmos que pode ser uma ilusão, então, tudo pode ser ilusão. Nesse caso, seria mais oportuno seguir pela vida como a seguem os animais destituídos, peixes ou lagartos. Agir sob o império da necessidade tal como esta se apresenta à consciência. É, talvez, o propósito dos que, ardilosamente, negam a realidade do livre arbítrio. Sugerir que não seja utilizado, ignorar tal faculdade, seguir comandos e esquecer a alma.

Quando a crença no determinismo foi aplicada à mente humana, disso resultou a negação do livre arbítrio, alegando-se que tudo, na atividade molecular do cérebro, era, em princípio, previsível. No entanto, essa convicção não se baseava em evidências científicas mas simplesmente na suposição de que tudo é totalmente determinado por leis físicas. Ainda hoje, muitos cientistas assumem que o livre arbítrio é uma ilusão. Não apenas que a atividade do cérebro é determinada por processos semelhantes aos das máquinas, mas que não existe um eu não mecânico capaz de fazer escolhas.

Sheldrake, Rupert. Science Set Free (The Science Delusion). Deepak Chopra Books, 2012.

Os animais não possuem livre arbítrio. As suas decisões não admitem escolha, são obrigatórias, feitas sob a coacção da necessidade ou do desejo. Tanto é assim que, aos animais, não se aplicam julgamentos morais. Eles não podem escolher entre o bem e o mal. Os animais têm consciência limitada, não dispõem da consciência moral, desde logo, da abertura reflexiva que leva ao escrúpulo, à hesitação. Podemos dizer que os animais são bons ou maus mas apenas segundo o nosso interesse, o nosso ponto de vista.

Ao observar a fidelidade do cão ao dono, a fidelidade do lobo ao grupo, a solicitude maternal em todos os mamíferos, até nas aves, tendemos a admitir que possuem uma certa conciência moral. Porém, isso é o instinto, a percepção inconsciente de que a sobrevivência do próprio depende da sobrevivência do dono ou do grupo. Mas concordemos que o instinto maternal abre caminho à consciência moral. Não é por acaso que a Mãe de Jesus é tão venerada entre cristãos e muçulmanos.

Livre arbítrio e ciência

É comum dizer-se que a ciência se opõe à ideia de Deus... A ciência demonstra que o mundo tem leis próprias e certas de funcionamento. Tais leis vão sendo conhecidas. É no desconhecido que Deus se esconderia. Mas o esconderijo é cada vez mais limitado. É como se o Deus das religiões estivesse sendo acossado. Finalmente, não terá onde esconder-se e extingue-se. É a ideia vulgar.

A ciência estabelece o reino da necessidade, a determinação e inevitabilidade da ordem material. Conhecido o hoje, pode deduzir-se o amanhã aplicando as leis da Física. Se observo uma pedra a cair sei que vai atingir o solo. E por aí fora, para todos os acontecimentos, simples ou complexos, de acordo com a conjugação das causas e a distribuição dos efeitos.

Afinal, é a própria ciência que aqui contribui para a afirmação do Espírito, a substância de Deus! O livre arbítrio desafia a ordem material. Quanto mais taxativas e gerais forem as leis da Física, mais escandalosa é a excepção do livre arbítrio das almas. Compreende-se a incomodidade dos cientistas que querem negar o Espírito. Porque o livre arbítrio só pode resultar do Espírito uma vez que a determinação material o não admite.

Pode apostar-se que os cientistas ateus inventaram algum subterfúgio. De facto, a mecânica quântica afirma que o resultado de uma experiência não está determinado à partida. Todos os fenómenos, ao menos à escala fundamental das partículas e dos átomos, seriam regidos por probabilidades, por ondas de probabilidade. É a observação humana do fenómeno que provoca o colapso da onda e o aparecimento da realidade objectiva. Dá para perceber que essa interpretação da mecânica quântica não anula o determinismo, apenas o interpreta e complica. Nem afecta a arbitrariedade da acção humana. Pelo contrário, parece torná-la mais decisiva, indispensável.

A mecânica quântica suspende a realidade, como se os dados lançados esperassem, no ar, que o jogador decida o resultado da tiragem. Seria a própria realidade material a acomodar o livre arbítrio, integrando-o no seu próprio processo. Não podendo negar o livre arbítrio, os físicos ateus pretendem incluí-lo no processo da natureza, disfarçando, assim, a necessidade da alma. No entanto o livre arbítrio é o contrário da incerteza. Não resulta do acaso probabilístico (passe o pleonasmo) transcende-o.

Um aparte sem especial interesse para o nosso debate. De Broglie, em 1924, inaugurou a mecânica ondulatória. A onda, em que cada corpo material consiste, supostamente probabilística, teria, afinal, significado físico. Uma interpretação que volta a estar na moda. Não nos importa. Tal como a hipótese do Big Bang, a mecânica quântica é assunto para físicos e irrelevante para nós, a quem basta a lógica elementar.

A única possibilidade de integrar o livre arbítrio no determinismo do mundo material reside na teoria dos mundos paralelos ou teoria dos múltiplos mundos ou, não faltam designações, teoria do multiverso. Cheira a nova habilidade do ateísmo militante? Certo. Os principais defensores de tal teoria militam no ateísmo. A teoria é esta. Todas e cada uma das possíveis decisões que eu possa tomar num dado instante, todos os possíveis colapsos da onda quântica, originam diferentes universos que se ramificam naquele instante. Isto é, em cada instante são gerados universos inteiros, tantos quantas as possíveis decisões que eu possa tomar, seja num contexto importante ou num contexto banal. Deus como O Filho

No quadro de cada universo, sou livre. No quadro do multiverso, a minha liberdade, ao fragmentar-se, perde o sentido.

Segundo a teoria do multiverso, será que os universos paralelos podem comunicar entre si? Não podem. Por tal, a teoria é inverificável. Ou seja, é irrelevante.

Se os físicos ateus acolhem uma hipótese tão radical e descabelada é porque estão desesperados. A alternativa ateia à causa primeira seria o infinito. A alternativa ateia ao livre arbítrio é o quase infinito número de supostos mundos paralelos.

Livre-arbítrio e o problema do Mal

um problema ineludível. Ainda que a liberdade das almas seja a liberdade de Deus na unidade e diversidade do Espírito Santo, é indiscutível que a vontade das almas parece poder contrariar a vontade divina. Esta dirige-se sempre para o bem enquanto a liberdade das almas parece poder dirigi-las para o mal. Até parece que a alma humana é mais livre do que Deus. Pode escolher entre o bem e o mal enquanto Deus é prisioneiro da sua bondade. Como pode o Deus omnipotente deixar-se desafiar? Como pode um Deus de absoluta bondade admitir o mal? Como resolver a aparente contradição?

Atribui-se uma função ao mal. O mal provoca sofrimento e o sofrimento é salvador. O sofrimento é provisório, tem a curta duração de uma vida, enquanto a salvação das almas tem a duração da vida eterna. Admite-se que alguma relação entre sofrimento, aprendizagem e salvação poderá existir no contexto de um plano divino cuja subtileza não se alcança.

Outra explicação para a presença do mal é a do anjo decaído, Lúcifer, manifestado em Satanás. As almas, iludidas por esse mestre do engano, deixam-se tentar a praticar o mal sem serem más. Tornam-se más, à força do hábito, por seguirem o maligno sem que o arrependimento se interponha.

Por serem as almas fracas ou imperfeitas, Deus enviou-lhes Jesus Cristo a fim de lhes redimir os pecados. Basta ter fé dizem os reformistas. Basta o arrependimeto, dizem os católicos. Jesus Cristo vem remendar a obra imperfeita de Deus? Nem nos parece que a simples fé garanta a redenção; demasiado fácil. Nem que o arrependimento, autorizando a redenção da alma, permita a remissão do pecado cuja realidade permanece nos destinos por aquele afectados.

Seja o sofrimento condição para a vida eterna, seja por manobra enganosa de uma entidade maligna, a presença do mal continua a parecer incongruente. Não interessa quais os mecanismos do mal, de onde vem nem para onde vai. O mal existe e não deveria existir num mundo criado por um Deus que é bom, poderoso e omnisciente, um Deus perfeito. De modo que tais explicações não servem; nem a virtude do sofrimento nem a fantasmagoria de Satanás.

Enquanto não se obtiver resposta para o problema do mal há-de compreender-se a falta de fé que atinge muitos. Porque podem, as almas, ser más ou tornar-se más quando fazem parte do Espírito Santo? Porque não podem ser salvas todas as almas? Será que a obra divina também gera desperdício, o qual, muito convenientemente, se lança ao fogão infernal? Não se acreditará que Deus seja tão limitado quanto os que congeminaram este esquema. Tem de haver melhor resposta!

Se as almas asseguram o livre arbítrio, são, necessariamente, de natureza espiritual. Sendo espírito, hão-de ser parte do Espírito (Santo) de Deus. Sendo assim, não podem praticar o mal. Não que não pudessem. Mas não está na sua natureza. Então, de onde vem o mal? Regressemos aos animais. Os animais são maus? Podemos dizer que o leopardo é mau quando ataca a pacífica gazela? Nem bom nem mau. É a lei natural. Na natureza não há bem nem mal. Um sismo ou outro qualquer acidente que as circunstâncias físicas tornam inevitável é um mal para as vítimas, directas ou indirectas, mas não é o mal. Mal é um substantivo comum não é um substantivo próprio, não tem personalidade.

O que chamamos mal é, apenas, a ausência do bem. O criminoso comporta-se como animal, animal especialmente perigoso e perverso. O pecador é, tão só, o animal humano que volta as costas à sua alma. O criminosos age como animal porque a sua alma está ausente. O livre-arbítrio não se manifestou. A alma nunca está presente quando, em alguém, o mal determina a acção. Quando a alma se abstêm do mundo, resta a consciência animal a qual nem é boa nem má. O leão abocanha a sua presa, o criminoso faz a sua vítima, o desregrado gera desperdício.

A ausência da alma no criminoso obriga a tratá-lo com a desenvoltura com que se abatem as feras. Ora, a coragem contrasta com o estereótipo do fiel, submisso e indeciso, na sua versão moderna.

O filósofo Nietzsche, no seu livro, Para Além do Bem e do Mal, proclamou a morte de Deus. Deveria ter proclamado a abstenção de Deus, não a sua morte. Mas acertou ao intuir que o mundo material nem é bom nem mau. É assim que o Filho nos desculpa, perante o Pai: – Perdoa-lhes porque não sabem o que fazem!

Deus aparenta estar muito pouco presente. Não morreu mas é como se tivesse morrido. Porque se oculta Deus? Porque criou ele o mundo material? São duas questões. Porque criou o mundo material, veremos mais tarde, é a questão central, a mais árdua. Deus não se oculta, respeita a nossa liberdade, não impõe a sua presença. A nossa liberdade, a da alma, que é uma liberdade positiva, e a do animal, que é uma liberdade pela negativa, são tão divinas quanto a Dele, porque são a Dele. Somos nós, à partida meros animais, que temos de O chamar se queremos que intervenha nas coisas do mundo, se queremos tera a alma presente.

É preciso falar com Deus para o tornar presente. Mas as distracções alimentam o esquecimento de Deus. Na Idade Média, a arte, a literatura, a vida comum, tinham Deus por fundo. Igrejas e catedrais, por todo o lado o honravam. Depois, arte, literatura, filosofia, tornaram-se distracções endeusadas, coisas supérfluas, muitas vezes, ideias avulsas. Os muçulmanos são mais focados em Deus, basta-lhes um livro, o Alcorão. Até ao século XVII, cientistas e engenheiros, as melhores mentes da Europa, eram ainda bons filósofos. Entretanto, a própria ciência se tornou uma distracção mais e, pela sua eficácia aparente, incutiu no humano a vaidade da suficiência.

A distracção de Deus, isto é, a nossa distracção em relação a Deus, vai muito longe. A ponto de ignorarmos as evidências da sua presença como criador do mundo e substância da nossa alma. Apesar de a vida corrente nos lembrar que cada efeito exige uma causa e que cada causa é efeito de uma causa anterior, recusamos encarar o necessário Autor da Primeira Causa. Apesar de a ciência nos avisar de que o livre arbítrio contraria flagrantemente o determinismo material, continuamos a achar estranho possuir uma alma. Nem interessa conhecer o detalhe das leis físicas, gerais ou particulares, interessa que existem e que o livre arbítrio, no seu alcance, ainda que eventualmente diminuto em cada acto do seu exercício, se sobrepõe a tais leis.

A alma é parte do Espírito Santo. Uma pequena parte. Mas basta para que possamos dizer que Deus habita em cada um de nós, como o afirmou Jesus na palestra da Última Ceia, como o demonstrou Santa Teresa de Ávila no seu livro, O Castelo Interior, que citaremos oportunamente. Afirmar que o mal vem das almas é ofender o Espírito Santo. Tal como Deus Pai -- o Criador -- é livre, assim a alma tem de ser livre também. Deus não pode limitar a liberdade da alma sem limitar a sua própria liberdade. Nem poderia condenar uma alma sem abdicar de parte de si mesmo.

Ainda que a alma nunca determine o mal por iniciativa própria, não pode dizer-se que não possa ser afectada pelo mal que o humano, à revelia de si, pratica. A alma não atraiçoa o criador mas pode ficar magoada, distorcida, doente por efeito das acções do indivíduo em que encarna. É por tal que existe o purgatório... A alma não deveria distrair-se nem enganar-se. A distracção da alma, a sua abstenção, resultaria de uma incompatibilidade entre si e o indivíduo onde encarnou. O engano da alma deve-se a falta de conhecimento, de informação; neste caso, teremos um arbítrio inadequado mas nunca maldoso.

O mal é a ausência do bem quando o bem é indispensável. Os gestos e acções maquinais que realizamos ao cozinhar, ao cuidar da higiene, ao desempenhar uma tarefa ou um trabalho rotineiros, não requerem o livre arbítrio, não são bons nem maus. Quando uma decisão deve ser tomada, caso o livre arbítrio esteja ausente, a aparente decisão segue a inevitável lei da selva: é o mal. Caso a alma se empenhe e vença, é o bem que se manifesta e nos encanta.

A parábola seguinte é bastante conhecida mas sempre oportuna. Um professor universitário desafiou os seus alunos com a seguinte pergunta:

– Deus criou tudo o que existe?

Um estudante, crente em Deus, respondeu: -- Sim, Ele criou!

O professor insistiu: -- Deus criou mesmo tudo?

Sim, senhor, teimou o aluno.

– Se Deus criou tudo, ele também criou o mal pois que o mal existe e, de acordo com o princípio de que as nossas obras definem o que somos, então, Deus é mau, – argumentou, o professor.

O aluno permaneceu em silêncio enquanto o professor saboreava a vitória, ufano da sua esperteza.

Outro estudante levantou a mão: – Posso fazer-lhe uma pergunta, professor?

– Claro, – respondeu o professor, orgulhoso e feliz por ter julgado silenciar os seus alunos crentes.

– Professor, o frio existe? – Desdenhoso, o professor retorquiu: – Que tipo de pergunta é essa? Claro que existe. Você nunca sentiu frio?

O jovem respondeu: – Na verdade, professor, o frio não existe. De acordo com a Física, o que consideramos frio é, na verdade, perda de calor (energia térmica) pelo nosso corpo. No zero absoluto há ausência total de calor, a matéria fica inerte. O frio não existe. Criamos essa palavra para descrever como nos sentimos quando perdemos calor.

O aluno continuou: – Professor, a escuridão existe?

O professor respondeu: – Claro que existe!

O aluno retorquiu: – Está errado, de novo, senhor. Também não há escuridão. A escuridão é, na realidade, a ausência de luz. Podemos estudar a luz mas não a escuridão. Usamos o prisma para dispersar a luz branca em várias cores e estudar o comprimento de onda que corresponde a cada cor. Mas não pode medir-se a escuridão.

O aluno continuou: – Se um raio de luz pode irromper num mundo de escuridão e iluminá-lo inteiramente, como saberíamos, antes disso, quanto espaço ocupa a escuridão? Escuridão é um termo usado pelos humanos para descrever o que acontece quando não há luz.

Finalmente, o jovem perguntou ao professor: – Senhor, o mal existe?

Hesitante, o professor respondeu: – Claro, como eu disse antes. Vemos isso todos os dias; é a multidão de crimes e violências por todo o mundo.

O aluno concluiu: – Não, professor, o mal não existe em si mesmo. O mal é simplesmente a ausência do bem. O mal, como a escuridão e o frio, é uma palavra que o homem criou para descrever a ausência de Deus. Deus não criou o mal. O mal não é como a fé ou o amor que existem como luz e calor. O mal é o resultado do que acontece quando o homem não tem a fé e o amor de Deus no seu coração. Ele é como o frio que vem quando não há calor ou a escuridão que vem quando não há luz.

O professor sentou-se, em silêncio. Alguns instantes depois, ainda quis contrapor: – E porque Deus criou a ausência do Bem, porque a permitiu?

Um terceiro aluno levantou o braço, sorridente. Dirigindo-se a todos, disse: -- Deus não constrange ninguém, não impõe o Seu Desejo. Pode afeiçoar as circunstância mas não determina comportamentos.

Continuou: – Deus é amor e conhecimento, como disse o meu colega. Mas, antes de tudo, é liberdade!

O mal é a consequência inevitável da clivagem entre o mundo físico e o mundo espiritual, é uma quebra. Como o mundo material é uma necessidade do Plano Divino, o mal é o preço desse Plano, é a dor de parto do renascimento do Espírito a partir da vivência terrena.

Deus como O Filho

O milagre da vida

Certamente que o leitor agnóstico aceitará tranquilamente a existência de Deus a partir dos dois argumentos anteriores. Argumentos que nada têm de sofisticado, cuja desarmante simplicidade não autoriza o sofisma.

Se Deus existe não deixará ele sinais da sua presença entre nós? A vida de Jesus é a manifestação mais comovente dessa presença. Mas a vida de Jesus ocorreu há muito. Um milagre permanente seria oportuno para sustentar a fé. Vimos as coincidências astronómicas. São milagres permanentes. Porém, há outro milagre permanente e exuberantíssimo.

Não bastou a Deus criar o imenso mundo das pedras, da água, das estrelas, teve de criar a vida biológica. Para quê? Para que, na vida, viesse a estabelecer-se a consciência e, na consciência, se introduzisse a alma. O que inicia a resposta à questão anteriormente aludida e objecto principal deste trabalho, o porquê de haver Deus criado o mundo.

Infelizmente, a encíclica Humani Generis, de Pio XII, foi publicada em 1950, dois anos antes da descoberta da molécula de ADN. Fosse dez anos depois, a Igreja poderia ter afirmado, apoiada na própria ciência, que, ao menos uma vez, teve Deus de intervir: no iniciar da vida biológica, na criação da vida a partir da matéria inorgânica pois que a abiogénese natural é impossível.

Quem desejava um milagre, algo grandioso. Aí tem! Toda esta vida riquíssima que pulula no planeta, provém de um espectacular milagre divino, de uma intervenção portentosa e localizada, iniciando o orgânico a partir do inorgânico.

Que dizer da teoria da evolução das espécies? A Igreja Católica não a rejeita, desde que não se inclua a alma como produto de tal evolução. Se Deus interveio, mais ou menos vezes, aqui ou ali, ao longo da evolução, ficaria ao critério de cada um. Mas uma análise científica séria até a própria evolução natural das espécies coloca em questão.

É interessante que a geração espontânea, a abiogénese, foi aceite por grandes mentes. Compreende-se o porquê de Aristóteles adoptar essa possibilidade; a vida não existiu sempre, sendo assim, o primeiro ser vivo terá sido gerado espontaneamente. Outros, depois dele, também acreditaram, irracionalmente, que organismos complexos podiam ser gerados expontaneamente, como as moscas, da matéria em decomposição.

Esta crença, dada como ciência, só em finais do século XVII foi contestada. Por meio de cuidadosas experiências, o biólogo italiano Francesco Redi demonstrou que não se geravam moscas em carne se esta, ainda que exposta ao ar e em decomposição, estivesse protegida da deposição de ovos por aquele insecto.

Curiosamente, pela mesma altura, a descoberta e uso generalizado do microscópio, permitindo a observação de micróbios, algo que não se conhecia, voltou a conferir crédito à geração espontânea. Só em meados do século XIX ficou absolutamente demonstrada a sua impossibilidade.

Mais curioso é que os adeptos da geração espontânea presumiam a existência, na matéria, de um certo “princípio activo” propiciador da vida. Essencialmente, o mesmo tipo de argumentação que os cientistas ateus têm utilizado para negar a necessidade do milagre divino da abiogénese embora com roupagem modernizada uma vez que é necessário que apareça, ao menos, uma molécula de ADN...

O ADN é uma molécula enorme que encerra o programa necessário ao fabrico de cada célula de cada planta ou animal superior, de cada fungo, bactéria ou vírus. Uma molécula, isto é, uma reunião de átomos -- no caso do ADN são milhões de átomos -- tão complexa que nunca poderia ter surgido do acaso de circunstâncias, ainda que absolutamente favoráveis, como, insensatamente, querem fazer crer os biólogos ateus.

 

Modelo de um curtíssimo fragmento de uma molécula de ADN.

A teoria da evolução das espécies explica a diversificação de uma dada espécie por efeito de mutações aleatórias que se revelem favoráveis a uma melhor adaptação do indivíduo mutante ao meio ambiente. Meio ambiente constituído por factores muito diversos, climáticos, geográficos e por todas as espécies que interagem com a espécie dada, ou por desta serem alimento ou por serem predadoras da mesma ou por haver colaboração (flores e abelhas colaboram). Uma hábil teoria proposta no início do século XIX por Darwin.

Mas foge-se da questão essencial. Deus teve de criar a vida a partir da não vida! Se voltou a intervir para dirigir a sua evolução é outra questão. No entanto, na cabeça de muita gente, as duas questões andam confundidas.

O título original do livro de Darwin é: Da Origem das Espécies por Meio da Selecção Natural. Título que, imprudente ou maliciosamente, foi abreviado pelo editor para: A Origem das Espécies. Em recuo cauteloso, passaram a referir a teoria da evolução das espécies e, já não, a teoria da sua origem.

As espécies evoluem através da diversidade dos seus indivíduos. Sendo assim, da evolução de uma espécie anterior originam-se novas e diferentes espécies. Não parece grande a diferença entre falar de evolução ou de origem. No entanto, o termo origem é enganoso pois que, onde não há qualquer dúvida é sobre a impossibilidade de a vida ter resultado do inorgânico sem intervenção de uma inteligência superior. Assim que se descobriu a extrema complexidade das mais simples formas de vida, pôde concluir-se, pela simples lógica das coisas, que a vida a partir da não vida não faz sentido sem um milagre.

A impossível abiogénese

Os laboratórios farmacêuticos sintetizam centenas de substâncias orgânicas a partir de matérias primas inorgânicas. Mas tais sínteses, ainda que infinitamente menos ambiciosas que a síntese do ADN, não ocorrem num único e continuado processo. como teriam de ocorrer na natureza.

Um laboratório especialmente equipado sintetiza a substância A; outro laboratório, também especialmente equipado, sintetiza a substância B; A e B são armazenadas, em condições especiais, como matérias-primas. Noutro laboratório, por outro processo especializado, A e B, reagindo entre si, originam a substância C a qual, por sua vez, ainda poderá ser matéria prima destinada a sintetizar a substância D. Mesmo em sínteses orgânicas relativamente simples, a cadeia de processos é sempre extensa e melindrosa. Cada processo tem de ser absolutamente regulado, num contexto exigente de exactidão e precisão industrial, quanto à temperatura, pressão, tempo, pureza das substâncias envolvidas, presença de catalisadores muito específicos, etc. Ora, no meio natural, não há regulação desses factores. A cadeia de processos, desde a substância A até se chegar à substância Z, longa e delicada, seria interrompida, na natureza, a cada passo, e tudo teria de voltar ao início.

Dir-se-á que a natureza tem tempo, milhares de milhões de anos. De tantas tentativas possíveis, uma resultará. Pois tem, tem muito tempo! Não terá, mesmo assim, tempo bastante. O tempo nunca será bastante. Mesmo uma pequena molécula orgânica, um medicamento vulgar, sempre possui mais de uma dúzia de átomos que é preciso juntar, passo a passo, passos delicados, a partir de unidades mais pequenas e mais estáveis, já de si quase impossíveis de obter por acaso.

A aspirina -- ácido acetilsalicilico -- é uma molécula com dúzia e meia de átomos, uma molécula muito pequena à escala das moléculas da vida. A sua produção a partir das matérias primas mais elementares envolve cinco etapas de síntese das quais se apresenta a última, a reacção do ácido salicílico com anidrido acético na presença de ácido sulfúrico.

 
 

Modelo da molécula da aspirina.

Insiste-se! A natureza tem tempo! Tem tempo mas parece ter sido prestes em iniciar a vida biológica. Esta terá surgido na Terra há quatro mil milhões de anos, pouco depois da formação do planeta, há cinco mil milhões de anos. Quase como se fosse inevitável. E, no entanto, uma molécula viva, isto é, uma molécula capaz de se reproduzir originando outras moléculas idênticas numa cadeia reprodutiva ininterrupta, terá de ser constituída por centenas de milhar, atente-se neste número, centenas de milhar de unidades moleculares elementares -- cada uma destas, em si mesma, já complexa -- ligadas umas às outras numa ordem certa. Não há um contínuo de complexidade entre a não vida, que não se reproduz, e a vida, capaz de se reproduzir. A forma mais simples de vida já é extraordinariamente complexa.

Juntar de uma certa maneira milhares ou milhões de átomos num dado momento, num dado local, parece impossível obra do acaso. Respondem: -- Não tem de ser num momento. A formação da tal molécula da vida constituída por milhares de unidades mais simples, o ADN, poderia ocorrer por fases. -- Não poderia, já o aduzimos atrás. Quanto mais complexa uma molécula for menos estável é. A já grandiosa primeira molécula da vida teve de se constituir de uma vez e depressa iniciar o processo da sua reprodução, antes de se degradar.

Veja-se o vírus mais simples. Ele precisa de encontrar rapidamente um hospedeiro onde se reproduza ou morre antes de continuar a sua estirpe. O seu ADN (ou ARN), o mais curto que se conhece, e conhecem-se muitos, contém cerca de três mil bases nitrogenadas. Note-se que tal vírus não é autónomo, requer um hospedeiro preexistente, bem mais complexo do que ele, uma célula viva.

Ainda que, na tal sopa química primordial, se formassem, facilmente, triliões de moléculas de ADN, de nada adiantaria. O esqueleto do ADN é muito solúvel em água. Qualquer molécula de ADN formada pelo acaso seria imediatamente desagregada.

O ADN não subsiste sem célula. Mesmo no núcleo da célula costuma estar encapsulado por proteínas especiais (histonas). É o que o microscópio óptico vê: os cromossomas. O ARN viral, por seu lado, está protegido por um envólucro (capside). Ora, a formação do encapsulamento é comandada pelo próprio ADN ou ARN.

 
 

Estrutura de um vírus.

Não há, pois, ovo sem galinha nem galinha sem ovo. Não há ADN sem cápsula nem cápsula sem ADN.

 

O milagre da vida não é de apreciação tão fácil quanto os milagres mais simples, como aparições e curas. Esta revelação divina, para ser acolhida, exige mais do que a simples aplicação da lógica elementar ou mais do que a imediata constatação de um facto surpreendente. Exige conhecimento.

Mas bastaria aplicar a lógica de um simples cálculo de probabilidades a tal conhecimento para que, em milhares de escolas por todo o mundo, os jovens estudantes adquirissem a evidência da autoria divina do aparecimento da vida biológica. Se se viesse a apurar, de modo claro, que o inorgânico não pode gerar a vida, a tal grande molécula que se reproduz, haveria a certeza de que Deus interveio uma segunda vez, para instalar a vida no mundo, depois de criar o próprio mundo.

De novo, é a ciência que descobre Deus. O que não admira! Se Deus é real, o conhecimento da realidade, o próprio da verdadeira ciência, haveria de O revelar, cedo ou tarde. A revelação consiste sempre na verificação de uma impossibilidade física, naturalistica, de um facto que, ainda assim, se apresenta.

Quantos estudaram Biologia no liceu e nunca se lhes ocorreu a evidência de que a vida não pode surgir do acaso. Claro que os donos do mundo, os usurpadores das escolas e do ensino não iriam facilitar a exposição de tal evidência. Pelo contrário, procuram escondê-la. Fazem-no com o despudor próprio do desespero.

Até à descoberta do ADN e do ARN não se sabia o que era a vida, de que era feita a vida ao nível molecular. Só a fisiologia se expunha ao olhar do microscópio. Antes de Pasteur, até perto do fim do século XIX, ainda se aceitava a possibilidade da geração espontânea. É, incrivelmente, onde os ateus ainda se refugiam. Se um rato, uma bactéria ou um vírus não nascem do acaso, a primeira molécula, supostamente precursora da vida, poderia.

Quando se pensava que a vida era um conjunto de automatismos, uma mera engrenagem química complicada, podia presumir-se que tal automatismo, começando numa simples alavanca, numa única reacção química, teria evoluído, pouco a pouco, até se atingir a extrema complexidade do animal. É a concepção grosseira do Homem Máquina.

A Bíblia refere que Deus, após fazer o homem do pó da Terra, lhe soprou nas narinas o sopro da vida, e ele tornou-se um ser vivente. Tal sopro da vida deu na energia vital, suposta forma especial de existência que estaria implantada nos organismos viventes. A medicina alimentou-se da energia vital durante séculos, camuflando o desconhecido sob uma expressão misteriosa a que cada qual agregou a sua forma particular de fantasia. Afinal, a vida é puramente material, prodigiosamente material, a matéria regida pela informação materializada no ADN e no ARN. É nestas moléculas que se vê a obra de Deus e não em fantasmagorias inconsequentes.

Estamos perante um escândalo! A vida foi criada por intervenção divina e ninguém diz nada? Como pode esconder-se a evidência? Como pode a gente da ciência afirmar o contrário do que tem por obrigação revelar, proclamar até? Depois de se saber que a vida é a complexidade levada ao extremo e que a transição do simples ao complexo não admite etapas, não restam dúvidas. Só Alguém omnipotente e omnisciente poderia criar a vida. Se foi na Terra ou se foi, antes ainda, noutro planeta, é irrelevante.

A explicação do ateísmo para tudo o que é especial é, sempre, que aconteceu por acaso, faça ou não faça sentido lógico. O mundo surgiu pelo acaso da singularidade quântica num espaço e num tempo que ainda não existia; o arbítrio humano é resultado do colapso da onda quântica de probabilidade; a vida surge fortuitamente como se, por simples acção do vento, se desenhasse, por acaso, uma obra prima na areia da praia.

Já que, para os ateus, a vida surgiu da espontaneidade do acaso, vamos calcular a probabilidade de um hipotético aparecimento casual da vida. A coisa é evidente, supérflua, mas, sendo importante, merece a atenção do detalhe.

Todos os organismos vivos, no seu desenvolvimento e no seu metabolismo, dependem de um programa pré-estabelecido que passa da semente para a planta, dos pais para os filhos, de bactéria para bactéria, de célula para célula. Tal programa está presente e activo em cada célula viva, sem excepção. Está presente em cada vírus, ainda que o vírus necessite de uma célula que efectue o “trabalho pesado” da sua reprodução. A cada espécie corresponde um “programa informático” próprio. Porém, o código de programação é o mesmo para todas as espécies de plantas, animais, fungos, algas, bactérias e vírus.

O programa da vida, o conjunto de instruções indispensáveis à síntese dos milhões de substâncias que constituem as inúmeras estruturas no corpo dos animais e das plantas, está codificado numa longuíssima sequência de moléculas, apenas de quatro tipos, que se vão repetindo em ordem exacta ao longo da cadeias do ADN.

Toda a programação da empresa Google monta a dois mil milhões de instruções (linhas de código). O genoma humano, programa principal que define cada indivíduo, presente no seu ADN, monta a três mil milhões de instruções (bases nitrogenadas).

ADN e ARN

Uma cadeia de moléculas formando uma única e longa molécula é um polímero. A borracha é um polímero natural. Os plásticos são polímeros artificiais. Que há de especial nos polímeros da vida, o ADN e o ARN? Num polímero comum é a mesma molécula que se repete. No ADN e no ARN, são quatro moléculas diferentes a repetir-se e a ordem por que se repetem tem um significado exacto. Tal como palavras num texto, sendo apenas quatro as letras disponíveis. Tal como bits num computador, os 0s e 1s. A sequência das quatro bases nitrogenadas constitui o programa codificado indispensável à definição de todas as características do indivíduo.

Os ARN são programas especializados que, recebido o comando do ADN, se encarregam de organizar o fabrico das proteínas e das restantes substâncias indispensáveis ao metabolismo desse indivíduo.

O quadro seguinte esclarece a estrutura do ADN. É uma dupla hélice cujo esqueleto é uma dupla cadeia de açucares fosfatados. Os dois ramos da hélice estão ligados por bases nitrogenadas complementares, ordenadas por certa ordem (o tal programa informático). O ARN é constituído por uma simples hélice. A informação genética (genoma) dos vírus é codificada em ARN ou ADN. As restantes formas de vida codificam em ADN.

 

O ADN foi descoberto em 1952, por Rosalind Franklin, por meio da técnica de difracção de raios X. A cadeia de ADN mais curta, a que mais facilmente poderia formar-se como fruto do acaso, contém mil e setecentas bases, no vírus da hepatite D. Mas um vírus não é organismo autónomo, exige um hospedeiro. A cadeia de ADN mais curta que codifica um organismo autónomo inclui 160 mil pares de bases, na bactéria C. ruddii.

Impossível que um conjunto organizado de milhões de átomos possa ser obra do acaso. Mas vamos a números. Ao ir a números, admitiremos, sempre, as circunstâncias mais incrivelmente favoráveis ao surgimento casual da vida.

Admitiremos que, em todos os planetas do universo, em número arbitrado pelos astrónomos, existem condições favoráveis à vida; que, todos os planetas, possuem oceanos tão extensos quanto os da Terra; que as tentativas aleatórias de originar a vida começaram logo no início do universo e continuam, incessantes e ininterruptas, até hoje; que, existiu sempre e em todo o volume de todos os oceanos uma hipotética e, de novo, muito improvável, para não dizer impossível “sopa química” de bases nitrogenadas em conveniente concentração e em condições de temperatura constante e ideal ao longo de toda a duração do universo; que, a cada milésimo de segundo, em cada gota dessa densa “sopa química” surge um arranjo propício à formação de uma molécula de ADN ou de ARN.

Que pensa o leitor, é um handicap razoável que se concede aos ateístas? Mais do que razoável e, mesmo, absolutamente irrealista. Supor uma “sopa” de bases notrogenadas é um disparate. Como se teriam sintetizado tais bases? Como se conservariam intactas essas moléculas instáveis? Pior, o esqueleto polimérico de açucares fosfatados é extremamente solúvel em água...

Os números em questão são tão grandes que fixamos, apenas, a sua ordem de grandeza. 10exp25, por exemplo, significa um 1 seguido de 25 zeros.

Calculemos o número de tentativas disponíveis para que surja um dado arranjo significativo -- em termos de informação -- de bases nitrogenadas:

Número estimado de planetas no universo, 10exp25; número total de pequenas gotas de água nos actuais oceanos da Terra, 10exp23 ; número de milésimos de segundo que o universo terá de duração, 10exp20. Assim, o número de tentativas dá:

10exp25   x  10exp23  x  10exp20  =  10exp68

10exp68 é um 1 seguido de 68 zeros. Número imenso!

Pois bem, tal número admite, como probabilisticamente razoável, a possibilidade de, naquelas circunstâncias absurdamente favoráveis, ocorrer a síntese casual de uma molécula certa de ADN com apenas 113 pares de bases nitrogenadas, uma e apenas uma só vez, em todo o universo e em toda a sua duração.

10exp68   =  4exp113

Começo bem modesto da vida que não é começo nenhum! Recorde-se que o menor ARN conhecido possui três mil bases e pertence a um vírus, organismo que ainda não é autónomo. O menor ADN de um organismo autónomo, uma bactéria, contém 160 mil bases.

Qual seria a probabilidade de obter, por acaso, um ADN mais longo, o do vírus com três mil bases? Por vezes, a natureza tem sorte... É a probabilidade de um macaco digitar duas páginas inteiras de um livro qualquer. Seria um milagre! Tal o milagre da vida.

A ridícula fuga dos ateus à evidência da criação divina merece insistente resposta:

Ao contrário do catecismo antes aceite, de que biliões de anos se passaram entre a formação da Terra e a origem da vida na Terra, biliões de anos durante os quais reações aleatórias em férteis poças de água cheias de energia teriam permitido que a vida evoluísse, Elso Barghoorn da Universidade de Harvard demonstrou, em 1970, que a vida começou tão cedo quanto pode ser geologicamente confirmado. As rochas mais antigas que podem conter fósseis, as rochas sedimentares, já possuem fósseis de micróbios, alguns capturados no ato da mitose, a divisão celular, a natureza já havia inventado a vida com capacidade de sobreviver, de se reproduzir, de armazenar e decifrar informação.

Poderia esse milagroso fluir da matéria inanimada para a incrível complexidade da vida ser o resultado de eventos puramente aleatórios? O incrível não é necessariamente o impossível?

Stephen Hawking, na sua Breve História do Tempo, o livro de ciência mais vendido de sempre, ensina o mundo sobre o poder potencial de eventos aleatórios para produzir ordem complexa, como a encontrada em uma obra de literatura. "É um pouco como as conhecidas hordas de macacos martelando máquinas de escrever. A maior parte do que eles escrevem será lixo mas, muito ocasionalmente, por puro acaso, eles vão digitar uma das obras de Shakespeare.”

É uma premissa convincente, mas totalmente equivocada pelo menos dentro de nosso universo, e é com a vida no nosso universo que estamos preocupados. Estou surpreso que o professor Hawking deixasse esse deslize ocorrer. No entanto, convenceu uma das principais revistas literárias do mundo, The New Yorker, a dedicar a sua capa de Natal e Ano Novo de 2002 a mostrar macacos martelando em máquinas de escrever. Como Hawking previu, a maioria não conseguiu nada. Mas eis que ali no canto inferior direito há um macaco muito feliz. Ele digitou um soneto. Podemos obter um soneto por acaso? Se Hawking diz isso, deve ser verdade... É mesmo?

Schroeder, Gerald L. God According to God. Harper Collins e-books.

A vida biológica é a demonstração mais inequívoca, mais concreta, de Deus! O universo, evidência do Pai, e o livre arbítrio, evidência do Espírito (Santo) de Deus, são, da mesma forma, inequívocos. No entanto, a criação do universo é muito remota e a maior parte do universo distante. A presença da alma é invisível. Mas a vida biológica é, por todo o lado, visível. É a nossa paisagem, o nosso alimento, o nosso corpo.

Aduzir que, por um processo de “panespermia,” alguma civilização no cosmos quase infinito teria feito chegar à Terra a vida biológica é um duplo disparate. Transferir para outro lugar o mesmo problema insolúvel do seu aparecimento espontâneo e aceitar que uma molécula de ADN ou uma célula hajam resistido a uma viagem prolongadíssima através do meio inóspito do espaço vazio.

Pensar que, geração após geração, ao longo de três ou quatro mil milhões de anos, estamos ligados directamente, fisicamente, inteiramente, a um acto divino prodigiosamente concreto é maravilhoso.

É necessário espalhar a boa nova. Nem para todos será boa, a nova. Trará pânico a muitos. Ainda que se rasguem horizontes de luz, olhar o céu pode causar vertigem. Mas o cientista que manipula os genes, deveria reverenciar o Divino Biólogo e, feito transgeneticista, coibir-se de atentar alegremente contra a sua Criação.

O que vai dizendo a ciência

James Tour, judeu cristão, é um especialista americano em Química Orgânica Sintética e nanotecnologia, professor de Química, de Ciência dos Materiais e Nano Engenharia na Universidade Rice em Houston, Texas, Estados Unidos. Veja os vídeos dele no You Tube. Ele considera que as explicações oferecidas pela teoria naturalista da abiogénese são factícias:

Pelo que eu vejo, a micro-evolução é um facto… O núcleo do debate, para mim, é a extrapolação da micro-evolução para a macro-evolução... Eu construo moléculas para ganhar a vida, não me canso de dizer o quão difícil é esse trabalho. Admiro Deus pelo que ele fez através de sua criação. Apenas um novato que nada sabe sobre ciência diria que a ciência tira a fé. Se você realmente estudar ciência, isso o aproximará de Deus.

Como o acaso é uma hipótese descabelada para a origem da vida, biólogos ateus começaram, entretanto, a referir a possibilidade de uma misteriosa lei natural que conduziria à organização espontânea da matéria. Claro que há organização espontânea de átomos em certas moléculas, é disso que trata a Química.

Desde a década de 1980, a crise na pesquisa sobre a origem da vida aprofundou-se. Francis Crick ( um dos que descobriram o ADN) lamentou, em 1981: “Um homem honesto, armado com todos os conhecimentos agora disponíveis, só poderá afirmar que, em certo sentido, a origem da vida parece ser quase um milagre, tantas são as condições que teriam de ser satisfeitas para que isso acontecesse”. Em 2008, no filme Expelled, Richard Dawkins (um biólogo ateu) reconheceu publicamente que “não sabemos” como a vida se originou em primeiro lugar e até confessou que a informação no ADN pode representar a “assinatura de algum tipo de projectista.” Não um projectista divino, no entanto. Ele propôs como “intrigante possibilidade” que uma civilização alienígena tenha evoluído noutro lugar do cosmos e “semeado” a primeira vida na terra. Anos antes, em 1973, num artigo científico na revista de astronomia Ícaro, Francis Crick e o seu colega Leslie Orgel avançavam esta mesma hipótese, que eles chamaram de “panspermia dirigida.” Depois, Crick revisitou a hipótese mais detalhadamente no livro Life Itself. Que figuras tão proeminentes quanto Dawkins e Crick, ardentes defensores da teoria da evolução e de uma abordagem materialista da ciência, postulem tal especulação apenas salienta a profundidade do problema da origem da vida e o enigma que lhe está intimamente associado da origem da informação genética.

Schroeder, Gerald L. God According to God (obra citada)

Como explicar o aparecimento de novas espécies vegetais ou animais? A selecção natural pode explicar o acentuar de características especiais dentro de uma dada espécie. A ovelha mais protegida por espesso pelo resiste melhor a sucessivos invernos rigorosos. A ave mais vistosa atrai mais facilmente o parceiro de procriação.

No entanto, a nova espécie requer uma profunda reorganização genética. Ora, a modificação casual da sequência de bases nitrogenadas do ADN conduz quase sempre -- na prática, é sempre -- não a uma nova espécie mas a um organismo inviável. De novo falta o tempo, imenso, para que, do acaso, surja algo frutuoso. Como explicar a explosão cambriana pela qual flores, dinossauros e mamíferos aparecem sem que nos registos fósseis se manifestem as necessárias espécies intermédias?

De modo que não é apenas a origem da vida que implica um projectista inteligente. O  aparecimento de cada nova espécie aponta para a necessidade de nova intervenção de um projectista para além dos processos espontâneos próprios da natureza física. Seja tal projectista da vida biológica o mesmo que criou o próprio universo ou o que se manifesta no livre arbítrio é uma questão nova que tem a ver com o que designamos por mundo espiritual.

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